23 novembro 2010

da crise

fala-se do fim do estado social a torto e a direito. para mim parece-me razoável perceber que algo está mal quando um estado não consegue garantir educação, saúde e justiça a todos os seus cidadãos.
no entanto também acredito que os passos que têm sido dados desde 1143 não têm sido em vão. assim, quando ouço argumentos do género "não é razoável o estado garantir hemodialise a pessoas de 90 anos", sinto que estamos também perante uma séria crise de valores.
há países que tratam os mais velhos como líderes, pela sua experiencia, pela sua sensatez, pelo reconhecimento de que se por acaso conseguiram atingir uma idade avançada é porque decerto que tiveram uma vida plena. quem não terá um avô que um dia terá dado aquele conselho que ficou para sempre. palavras sábias que guardamos durante toda a vida.
pois, a mim choca-me que nos recusemos a prestar os devidos apoios a quem de facto necessita, àqueles que fizeram de nós aquilo que somos hoje. a diminuição real de salários parece brincadeira de crianças quando comparada ao retrocesso civilizacional que será deixarmos de ter capacidade ou vontade de tratar dos nossos mais velhos.
a crise não tem solução fácil e as propostas fáceis são apenas décor!

02 outubro 2010

introdução

Silêncio.
olhos fechados e na mente uma imagem a preto e branco (sobre chuva e poças)

inspira
expira (repetir algumas vezes)

discretamente, como um animal nocturno que aparece timidamente no início na noite, umas notas
música

boa música, algo apropriado ao momento e merecedor de romper com o silêncio

Todo este processo poderá ser repetido à exaustão.

25 setembro 2010

Incêndio de origem criminosa na Lagoa do Fogo

A notícia do Açoriano Oriental apareceu na Sexta-feira e referia-se a um incêndio ocorrido na "quarta-feira à noite".
Estranho que numa ilha em que por diversas vezes os profissionais se queixam de falta de notícias não dêem a devida cobertura a um fenómeno deste género: a notícia não só aparece dois dias depois do sucedido como também mais parece uma nota de rodapé perdida no meio do jornal.
Será que os incêndios nocturnos em zonas protegidas que recentemente concorreram no maior fenómeno mediático (Portugal 7 Wonders) da actualidade são assim tão vulgares na Região Autónoma dos Açores?

25 junho 2010

Reacções

Ex.ma Sr.ª Ministra da Educação
C/c ao Ex.mo Sr. Director Regional de Educação do Norte
Ex.mo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Braga
À Comissão de Educação da Assembleia da República
Ao Conselho Nacional de Educação

O Conselho Geral do Agrupamento de Escolas de Nogueira, Braga, em reunião extraordinária no dia 22 de Junho, para apreciação da Resolução de Conselho de Ministros N.º44/2010, solidariza-se com a posição assumida pelos Directores dos Agrupamentos de Escolas e Escolas Não Agrupadas do Concelho de Braga.

É razão fundamental para esta tomada de posição, o modo como a administração central iniciou o processo, de forma precipitada e pouco clara, sem auscultação das comunidades educativas e considera que é necessária uma reflexão mais profunda e alargada acerca da implementação desta Resolução, exigindo-se, para o efeito, a obtenção de pareceres junto dos órgãos de direcção e gestão de cada organização educativa.

O reordenamento da Rede Escolar do Ensino Básico e Secundário, proposto nesta Resolução, pretende garantir três objectivos:

* Adaptar a rede escolar à escolaridade obrigatória de 12 anos;
* Adequar a dimensão e as condições das escolas à promoção do sucesso escolar e ao combate ao abandono;
* Promover a racionalização dos agrupamentos de escolas de forma a favorecer o desenvolvimento de um projectivo educativo comum, articulando níveis e ciclos de ensino distintos.

A obrigatoriedade de um percurso limitado às opções do respectivo agrupamento vertical põe em causa a livre opção do percurso formativo dos jovens no quadro do ensino secundário;

A inexistência de obrigatoriedade de uma sequencialidade no quadro do mesmo agrupamento põe em causa o fundamento estruturante da Resolução.

Relativamente ao segundo objectivo, considerou-se que não existem estudos comprovativos da relação entre organizações educativas de grande dimensão e um maior sucesso educativo. Os estudos apontam em sentido exactamente oposto.

A diversidade da oferta formativa contemplada no Ensino Secundário contraria a possibilidade de uma sequencialidade obrigatória no âmbito de um mesmo Agrupamento;

No referente ao terceiro objectivo, será conveniente assinalar que a construção de projectos educativos, a serem substantivos em matéria de formação, têm de ser o resultado de uma construção participada pelos diferentes agentes educativos, espelhos de identidades construídas consensualmente e jamais impostos superiormente e aplicados em mega-organizações.

Assim entendemos que:

* O objectivo não é, de modo algum, aumentar a qualidade da Educação mas apenas embaratecê-la.
* No plano pedagógico, haverá sérios constrangimentos à boa organização e funcionamento dos futuros agrupamentos de enorme dimensão e das suas estruturas organizacionais intermédias (Conselho Pedagógico, Departamentos e outros.)

Relativamente ao processo como estão a ser constituídos afirmamos ainda:

* A eventual irregularidade e ilegitimidade de uma decisão tomada à revelia dos Conselhos Gerais que, segundo o Decreto-Lei de aprovação e regulamentação da sua actividade enquanto órgão de direcção estratégica do Agrupamento, deverá ser consultado e informado, atendendo ao impacto que a mesma tem na comunidade escolar e educativa;
* A imposição das medidas às escolas sem a prévia auscultação das respectivas comunidades educativas, nomeadamente do Conselho Geral, contrariando um dos requisitos necessários para a constituição dos Agrupamentos Escolares, definidos no Decreto Regulamentar n.º 12/2000, de 29 de Agosto, de acordo com o qual “a iniciativa para a constituição de um Agrupamento de Escolas cabe à respectiva comunidade educativa, através dos órgãos de administração e gestão dos estabelecimentos interessados”;
* O facto de órgãos eleitos (o Conselho Geral e as Direcções) há pouco mais de um ano e por um período de quatro anos verem os seus mandatos e tarefas abruptamente interrompidos, questionando-se sobre a legalidade deste processo.

Assim, sendo os Conselhos Gerais o espelho de cada comunidade educativa e os órgãos responsáveis por mandatar os Directores e acompanhar os respectivos projectos de intervenção, entendemos que deve ser solicitado a aos Conselhos Gerais o respectivo parecer sobre a eventual proposta de reordenamento.

Este Agrupamento tem um rosto e uma identidade, os seus Documentos Estruturantes foram criados à luz dessa identidade e é essa identidade que queremos manter, para de forma humanizada e gerida com proximidade caminharmos no sentido de uma efectiva melhoria do sucesso dos alunos da Comunidade Educativa que democraticamente representamos.

Este parecer foi aprovado por unanimidade.

17 abril 2010

são escolhas...

seguimos levianamente através dos mais fantásticos acontecimentos dos últimos tempos (atrever-me-ei a afirmar "séculos"?). a Mãe Terra manifesta-se como há muito não o fazia. normal? muito provávelmente. imprevisivel? bastante, mas certamente que não totalmente. pelo menos, se bem me recordo dos anos de escola e das aulas de ciências da vida, a Terra é formada por placas mais ou menos móveis. naturalmente acredito que se mexe num lado, de certo haverá respostas noutro... mais ou menos como o fenómeno duma onda no mar (ou, mais simplesmente falando, como num estádio de futebol). e nós Homo sapiens sapiens o que fazemos? seguimos levianamente. seguimos com atenção os movimentos palacianos que a tv nos oferece, em forma de novelas. o clima da Europa assemelha-se ao das zonas extremas com tempestades tropicais e ondas de frio polar. e nós Homo sapiens sapiens o que fazemos? seguimos levianamente. seguimos com atenção os movimentos palacianos que a tv nos oferece, em forma de novelas. para que servem tantos estudos nas mais diversas áreas de conhecimento? para nos vender refrigerantes e pipocas?

11 abril 2010

Mosaico

Eu sou um animal, como qualquer outro ser humano. Sou (somos) um mosaico de sentimentos e de instintos.
(temos que gerir todos esta bagagem sentimental)

Chegar à outra margem. Há sempre outra margem.

Um mosaico... ou um vitral. Com a luz certa as sombras também formam imagens.

Amizade, amor são mosaicos, assim como o desprezo, a indiferença e o ódio. Os meus Ensinamentos são estes: ao contrário das ditas "religiões", deve-se odiar, pois faz parte da nossa natureza animal, mas devemos orientar estes ódios para as pessoas certas.

Só assim a sombra assim formada poderá ser a mesma do caminhante num belo dia de Verão.

05 abril 2010

Mudança é uma palavra

Quando era criança vivia em Montréal. Todos os Verões havia sempre alguém para ir buscar ou levar até ao aeroporto internacional da cidade (não me lembro bem qual era). Claro que o aeroporto parecia-me, evidentemente, enorme (eu era em comparação muito pequeno). Lembro-me de andar de um lado para o outro, explorando o local. Havia, contudo, um local que me fascinava: eram uns bancos, individuais, no qual se encontrava uma pequena televisão. Esta era activada quando com uma moeda de 25 cts, o que era muito dinheiro para mim (era pequenino!).
(esses assentos eram pretos e tinham uma estética vagamente Star Wars ou então sou eu que tinha uma imaginação galopante)
Sabem que mais? gostaria de passar por esse miúdo e colocar uma moedinha na televisão...
Estou a dever-lhe isso.

01 abril 2010

Petite divagação

Um dia de cada vez
(cada dia corresponde a 24 horas)
Umas horas de cada vez.
O Senhor PBS senta-se à janela (com vista para o monumento aos soldados mortos na Grande Guerra) e pensa “São umas horas de cada vez apenas isso”.
(com o olhar procura empurrar o pensamento até ao rio Tejo, que corre por cima da estátua do soldado)
Como se estivesse a subir umas escadas, um degrau de cada vez, para não cansar (saltar dois ou três degraus chega-se mais depressa ao fim, mas cansa muito mais). Como na vida, não se deve saltar várias horas de cada vez, senão cansa mais.
O Senhor PBS volta a ler este texto desde o início. As escadas também de descem, podemos descer também nos dias ou pelo menos parar de subir? Para ler este texto, desço ao longo do texto, também não posso saltar palavras ou não posso lê-lo de baixo para cima.
(talvez o faça e descubra algum significado oculto, ou dê origem a um texto literário experimentalista)
Um dia de cada vez, uma hora de cada vez, um momento de cada vez.... Trata-se no fundo de viver uma palavra de cada vez e isolá-la bem com o silêncio do soldado desconhecido.

28 março 2010

Uma questão de asas

Há pessoas que só mudam de galho se houver outro disponível.

Outras saem do galho por não ser o seu.

18 março 2010

Um livro

Sim, PBS sonhou que tinha um livro na mão (um livro banal, comum). Não se recorda nem do autor nem do título. Ele abriu na última página e viu aquele último ponto final. PBS reflectiu e pensou: haverá algum significado naquele espaço entre o ponto final e o fim do livro como objecto físico?

16 março 2010

Perder tempo juntos

Vamos supor (supor apenas) algumas afirmações
(suposições)
Suponhamos que, à partida, nenhuma delas é verdadeira.

...

09 março 2010

O cão

Quem é amigo de PBS sabe que este tem sempre muitas histórias caricatas com as mulheres.
Porém, PBS atingiu o auge no domingo passado: ao perguntar a uma menina se ela queria sair, esta respondeu-lhe que não podia porque, e cito, "vou dar banho ao cão"
hehe
Pensando bem, até dá uma boa história para rir da próxima vez que tomar uma cervejinha com RDL!

28 fevereiro 2010

(Gary Zukav)

"Por favor, diga-me quem você é e o que você quer. E se você pensa que estas são questões simples, tenha em mente que a maioria das pessoas vive suas vidas inteiras sem chegar a uma resposta."

27 fevereiro 2010

Algumas notas

Dó Ré Mi Fá Sol

(STOP)

PBS gosta quando o açúcar está compacto (não duro como uma rocha, apenas compacto), pois adora fazer buracos com a colher, o mesmo que fazia na sua infância na neve.
PBS pensa sempre no mito da Atlântida quando coloca açúcar num galão (ou meia de leite): por causa da espuma o açúcar forma como que uma ilha que depois de afunda.
(mudando de registo:)
PBS é calvo e não tem qualquer problema com este facto. Todavia, ODEIA que as pessoas falem nisso, mesmo a brincar.
(Corolário relativamente à afirmação anterior: Pedro Silva tem uma enorme capacidade em perdoar quem o faça).
PBS acredita que o banho da manhã (se não faltar gás) é o melhor momento do dia. Sempre.
PBS preocupa-se com a sua higiene oral.
PBS pensa frequentemente nos hamsteres da sua infância.
PBS olha olhos nos olhos com o seu reflexo no espelho.
PBS pensa que nada muda o presente, nem sequer o futuro.

15 fevereiro 2010

Tzu-Hsi



Tiger Photos -- National Geographic

meiga e virtuosa. Tzu-Hsi foi também ambiciosa de poder, impiedosa e uma das mais dotadas mulheres na política imperial da China do princípio do século XX. em 1902, um dos outros anos do zodíaco chinês dedicado ao tigre, a imperatriz decidiu banir a prática da morte por milhares de pequenos cortes. antes, tinha mantido o poder depois de alegadamente ter assassinado a concubina grávida do novo herdeiro ao trono da cidade proibida.

14 fevereiro 2010

From The Sunday Times February 14, 2010

Portuguese look to Brazil, not Brussels, for help

Faced with a Greece-like situation, people are relying on Latin links

Outside the Brasilia sandwich bar in a poor part of Lisbon one afternoon last week a group of men leaned against the wall, chatting and smoking cigarettes. One of them whistled at the black prostitute touting for business over the road. A beggar in a threadbare coat swigged from a bottle.

Welcome to sunny Portugal.

Known for its seaside resorts and soulful fado music, the unassuming country on the western frontier of Europe is just as much in the mire as Greece as it struggles with soaring debt and rising unemployment, which have pushed a naturally melancholic people to the brink of despair.

Any mention of the word “work” provokes sniggers outside the sandwich bar. “There’s no jobs round here,” says Dario, 30, a bricklayer. “I’d go to Brazil if I could afford the air fare.”

Jose Socrates, Portugal’s socialist prime minister, finds himself in a corner. Having lost his majority in September’s elections, he is struggling to keep order. He insists that his country does not need help from the European Union, let alone the International Monetary Fund, to restore fiscal health.

The markets, however, do not seem convinced by assurances that spending cuts alone will bring the deficit — which reached 9.3% of GDP last year — to below 3% by 2013.

It takes a lot to stir the introspective Portuguese, but a giant demonstration has been called for March 4 to vent anger against a promised publicsector wage freeze and job cuts.

Like neighbouring Spain, the country has taken great strides from the days of dictatorship, emerging with optimism and relief into the sunny upland of paved roads and democracy after joining the EU in 1986.

Socrates boasts that in the five years he has been in office Portugal has become one of Europe’s leaders in renewable energy and electronic government, allowing more and more citizens to pay their bills over the internet.

He has won plaudits for guaranteeing every schoolchild a laptop computer and English lessons from the age of six. Although they may not find a job at the end of it, 35% of Portuguese people now go to university.

What sustained Portugal before, though, was not the dynamism of its politicians but its low labour costs. Eastward expansion of the EU and the loosening of trade barriers with Asia were disastrous for Portugal. It found it could not compete with the likes of the Czech Republic and Slovakia. The economy stopped growing a decade ago.

“We must learn to adapt, to diversify and rediscover the dynamism of our ancestors,” said Antonio Monteiro, a former foreign minister and ambassador to Paris, referring to the golden era of the great 15th-century navigators. “We must learn to compete in a globalised world.”

People are sceptical, though, about the government’s chances, and for many a voyage of discovery seems preferable to sitting out an economic meltdown at home: the “brain drain” has accelerated in recent months as unemployment has crept up to almost 11% — it is double that for the young — with signs of worse to come.

The promised budget cuts, casting doubt over muchvaunted projects such as a high-speed rail link to Madrid and a new airport in Lisbon to replace the tiny one on the edge of the city, have heightened the sense of uncertainty.

By contrast, Brazil, a Portuguese-speaking power in the tropics, seems a land of opportunity. “We feel closer to Brazil than to Germany or other European countries,” said Luis Barbosa, a telecommunications company director who spent 15 years running businesses there. “We have the same, easy-going temperament.”

He talks about the reemergence of a “golden triangle” binding Portugal, Brazil and Angola, another former colony, which has become one of Africa’s largest oil producers.

“It will never replace Europe,” he said. “But it’s a useful card to have up our sleeve.”

The balance of power may have shifted, though, in this age-old alliance, and some refer to “reverse colonisation” to describe the way newly rich Angolans are buying up chunks of the Portuguese economy, not to mention the goods in the Louis Vuitton store on the Avenida da Liberdade in central Lisbon.

Others talk of the “Latin-Americanisation” of Portugal, not just because of the influx of Brazilian money. About 20% of Portugal’s population is estimated to be living below the poverty line, and the contrast between the weed-choked immigrant slum on the edge of Lisbon known as Cova da Moura, or “Moor’s den”, and the poolside villas, gated communities and luxury hotels on the coast at Cascais reflects the greatest gap between rich and poor in any European country.

BMW unveiled its latest 5-series model at a glitzy event in a Cascais hotel last week. But not even this opulent enclave is safe from the storm: the Casino Estoril, a cathedral of gleaming marble and neon owned by Stanley Ho of Macau — another former Portuguese colony — recently laid off 100 workers.

Expensive cars gleamed in the car park on Wednesday night but the atmosphere inside suggested a funeral parlour: there was not a high roller in sight as a group of bored-looking retired people stared in silence at a turning roulette wheel.

Cova da Moura, considered the most sordid slum in the country, is by no means as desperate as the rag-strewn slums around Rio de Janeiro, but taxi drivers are not happy to go there. African youths sitting in doorways glare menacingly at drivers who venture in.

The more worrying part of “Brazilification”, perhaps, is Portugal’s apparent powerlessness against South American drug-trafficking gangs that have taken root with impunity on its soil. Police say about a third of Europe’s cocaine comes in by sea through Portugal.

For some the pull of Latin America is an example of life imitating art: in The Stone Raft, a 1986 novel by Portugal’s Nobel laureate Jose Saramago, the Iberian peninsula breaks off from Europe and floats westward out into the Atlantic.

Portugal insists that it has no intention of leaving Europe, let alone reinstating the escudo. “That will never happen,” says Monteiro, the former diplomat. “We are in Europe and will stay there.”

31 janeiro 2010

Perdoa-me RDL, mas sei que és um amante da livre expressão

Cem anos de simulação

Não vou aos touros, não gosto (genericamente) de fado e nunca experimentei o mais vago sentimento monárquico. Mas comemorar a Iª República é igual a comemorar o dia em que o nosso tio-avô contraiu sífilis. A abolição da monarquia constitucional resultou da acção de um pequeno bando de rústicos, de carácter, conduta e aspecto duvidosos. O regime imposto pelo bando foi um exercício de limitação sucessiva de direitos concedidos, é verdade que moderadamente, até 1910. Fora a famosa liberdade religiosa, um pretexto para perseguir o clero, no resto, contas por alto, condicionou-se a liberdade de expressão, mediante censura activa, e a liberdade de voto, entretanto restrita aos alfabetizados – cujo número, durante a vigência “progressista” de Afonso Costa e comparsas, misteriosamente quase não sofreu alterações (durante Salazar, curiosamente, sim).

As consequências imediatas de semelhante delírio traduziram-se na emergência do Estado Novo, que adaptou a trela nos costumes e contrapôs ao caos governativo e económico um modelo de ordem, para alívio inicial das massas. As consequências a longo prazo ainda se sentem hoje, quando um país teoricamente civilizado festeja com pompa oficial a delinquência e o atraso de vida, afinal os autênticos “valores” da I República, de que a III, para nosso embaraço, pelos vistos não abdica.

Alberto Gonçalves

Diário de Nótícias, 31 de Janeiro de 2010